sábado, 18 de abril de 2009

A febre da tartaruga

Fritatartaruga,
de perninhas ou de ventre
nas pedrinhas do chão quente

Cozinhatartaruga,
cozinhescondida, em
casinha escaldada

Fervetartaruga,
Ebule bolhas
nos olhos,
Ebule bolhas na pele da nuca,
e nunca amolece as pecinhas do casco

Assatartaruga,
santatartaruga,
estufassa
inchestufa
esturricárcere
séca
sécozinha
esfarelescorre
ôfogedafebre
ô fóge qual lebre
ou finca pé e fica
finca pé e fiqualtartaruga

domingo, 12 de abril de 2009

“Ela está só um pouco aquém de incontáveis limiares”

“Ela está só um pouco aquém de incontáveis limiares”

(*em breve, um curta metragem Cine-Stràge)


Os peitos dela
Quase chegam a ser feios
De tão grandes

Os quadris
Quase são largos demais

A cintura
quase chega a destoar
De tão esguia

E os dentes
Quase artificiais
De tão direitos

Mas tudo, tudo nela,
acaba sempre um pouco antes
está só um pouco aquém
De incontáveis limiares

Inverdade vos digo

"Inverdade vos digo"

A força é sempre bruta
Os pecados são sempre capitais
Toda mudança é brusca
O inconsciente é sempre coletivo

Inverdade em verdade, eu vos digo:
Uns chamam de certo
outros chamam de errado
uns chamam de verdade
outros chamam de mentira
mas só compreendem direito
os que não chamam de nome nenhum
Quem pensa por si próprio duvida.
Mas hesita antes de duvidar,
porque ser cético já é seguir
um raciocínio pronto

inverdade, inverdade vos digo:
Dinheiro perdido pra amigo
Não é dinheiro perdido
Comida perdida pra amigo
Não é dinheiro perdido
Talento não é só o que existe
Experiência não conta nada
O que conta é ingenuidade e perversão
Ou melhor: se é que a ingenuidade existe mesmo
que me pegue ela de calças na mão!

Jamais polímeros
Jamais cerâmicas
Jamais metais o bedelho em credo alheio

Recado pra quem fica

“Recado pra quem fica”

Agradeço ao meu dentista
pelo meu lindo sorriso
e aa minha terapeuta por tentar

Agradeço aos coetâneos
por me ensinar da vida
e aas idas gerações por me pouparem

A quem me serviu de exemplo
devo todos meus defeitos
qualidades devo aa quem eu não respeito
Já que nada existe fora
de que tire algum proveito
um alguém que vai-se autossatisfeito

Aa quem gosta de prazer
devo minha auto-estima
e a quem não gosta, que será que devo?
Nestas páginas escrevo,
meu recado pra quem fica
se é que alguém vai ficar mesmo
nessa bosta de lugar

"São José"

"São José"

No escritório tinha dois Josés da Silva
a gente discernia eles pelo apelido:
um era o São José
outro era o Louco José.
O São José era São José porque era são;
O Louco José era Louco José porque era locão.
O São José colava em tudas roda de droga,
mas ficava são;
O Loco José colava mais nas roda de mato,
e ficava bem passado.
O Loco José apresentava o fumo às vezes;
O São José sempre acabava tendo que enrolar
quando a roda ja tava moribunda,
e sempre só ele tinha saliva
pra goma dos jacaré;
O Loco José descobria canal até ne época moiada;
O São José decorava os telefones dos corres,
e emprestava a bicicleta de boa.

Metade

"Metade"

Eu sou uma laranja verde

Eu sou mais do que metade
de uma laranja verde
Mas me ainda faltam bagos
para ser laranja inteira

Eu sou uma laranja verde

Eu sou menos que metade
de uma laranja verde
já que outra metade ou menos
não me faz laranja inteira

Eu sou uma laranja verde

Talvez falte primaveras
e eu não deixe de ser verde
mas procuro não deixar de ser laranja

Talvez sobrem primaveras
e eu resolva ser metade
e desista então de ser pra sempre verde

por medo de ser fração quebrada?
por medo de ser da cor errada?
ou por medo de altura?

Eu sou uma laranja verde
Eu sou uma laranja
côr-de-laranja:
verde mesmo.

Cocô Puro

"Cocô Puro"

Eu sou um cocô puro.
Mas o que é um cocô puro?
O que é que um cocô puro tem
que não tenha o que não seja um cocô puro?

O que caracteríza um cocô puro?
O que impede um cocô puro
de não ser um cocô puro?

O que torna um cocô puro um cocô puro?
O que faz de um cocô puro um cocô puro?
Como surge um cocô puro?
ou será que o cocô puro sempre houve?

O que resta a um cocô puro?

O que falta a um cocô puro?

Vou dialogar sozinho
e tretar com todomundo
pra voltar devagarzinho
a ir sendo um cocô puro
após

"Eumicetos com nome de mulher"

"Eumicetos com nome de mulher"

A Carmen brota da terra,
Cristina cresce do mato
Marcela brota em seixos
e aflora em moitas

Aline é encontrada ao acaso,
nos dias em que chove no pasto,
Rebeca tá perto da poça,
Lívia perto da passagem

Debaixo da sombra do tronco,
do lado da cova do toco,
na parte molhada da pedra,
na parte já seca da planta
À Amanda um besouro levanta
a formiga picota Elza inteira
O rato acha Elis em bueiro
O pardal usa Helena no ninho
Suelen cresce na mata, cresce na floresta
cresce no bosque, lá encima, no alto da colina

O vento leva Ana embora,
Silvia cresce onde o homem não acha
Gabi cresce, esporula, seca, e morre,
e a brisa leva lasquinhas da Célia pro mar
A Jéssica afunda, ela boia na água,
pexe come, otro pexe come e caga,
e otro pedaço chega pro otro lado...
Até...

até que a Ingrid cresce na praia, cresce na areia,
na areia salgada,
cresce na palha,
e na grama, e na laje
a Celina embolora parede,
a Taís enobrece qualhada
Ivete encharca rolha, ela cresce na cortiça,
Fernanda cresce na terra,
cresce nos grãos de barro
Inês cresce nos farelos
e
não
faz
mal
nenhum

“Pelo conflito de Silas”

“Pelo conflito de Silas”
(para Silas)

Por favor, meus bons amigos
com amor, lembrem-se sempre
Que aos amigos mais bem-quistos
Meus mais justos laços prendem

Justos e tão bem atados
Que por nada são rompidos
Nem há tempo nem espaço
Que de vós me aparte, amigos

Ah, pudera eu impedî-lhos
de que a vida os leve embora
Ah, pudera eu, meus queridos,

Dividir-me pra segui-los
Ou juntá-los em um só
Pra levar sempre comigo

Eu nasci para dormir de calça jeans

“Eu nasci para dormir de calça jeans”

Eu nasci para dormir de calça jeans
Dormir na grama, ou debaixo de uma sombra
Eu nasci para dormir no chão do asfalto

Eu nasci para dormir torto
Deitado em cima da mochila
Deitar no sol, dormir no meio das formigas
Eu nasci para dormir no chão molhado

Eu nasci para comer coisas do mato
Eu nasci para comer protozoários
Eu nasci para comer folhas de galhos
E galhos finos, e pequenos besourinhos

Eu nasci para dormir no chão da sala
Ou no banheiro, com um papelão na cara

Eu nasci para dormir de caça jeans
Nasci molhado, pra dormir sem tomar banho
No chão dos outros
No chão das outras
Em dia quente
Em dia frio

Não nasci para não ir porque eu não quero
Eu nasci para não ir porque eu não posso

Eu nasci para dormir atrás de porta
No chão gelado
Dos azulejos
Eu nasci para dormir em degrauzinhos
Chão sem varrer
Faltando taco

Eu nasci para dormir de calça jeans
Eu nasci para dormir alí mesmo.

Eu deito trancando a passagem
E quem quiser que passe em cima
Ou que pule por cima de mim
Ou que pise ne mim que eu nem ligo

sábado, 4 de abril de 2009

“Mil papéis de bala”

“Mil papéis de bala”

-Dá-me uma mordida?

-Depende.
Seria em nome do prazer
,ou em nome da nutrição?

-Em nome do prazer.

-Então não.
Esta comida veio em boa ocasião de fome minha.
Calha de ser de um gosto bom,
de que decorre seu potencial para gerar prazer.
Um prazer de qualidade,
o nobre prazer alimentício.
Mas o seu prazer parece ridículo e indigno
em face aas minhas necessidades primárias.

-Mas só uma mordidinha.
E eu também estou com um pouco de fome.
Uma mordidinha em nome da nutrição, então.

-Pois bem.
Uma simples mordidinha
nada pode fazer
em favor da elevada causa de que se trata a nutrição.
Com efeito,
uma simples mordidinha
muito mais pode enviar-lhe
um falso sinal ao organismo,
e confundi-lo
em termos de causar
uma perturbação
no bem-administrar das reservas que já possui.
Uma simples mordidinha
é que nem o beber de água salobra daquele que tem sede.

-Ah, diow.
Então me dá metade.

-Não. e vai tomar no cu.

**

“Jesus de pé (Antiantropomorfismo)”

“Jesus de pé (Antiantropomorfismo)”

O meu Deus não tem direita
Pra Jesus sentar-se à ela
Há de vir a julgar-me
De pé.

"Crueldade"

“Crueldade”

dor
agressão
carnificina de golfinhos
carnificina de ursinhos
polares
branquinhos
carnificina de algum bicho bonitinho
dor
insônia
agressão
Ela se foi
se foi
para as colinas e morreu
estrangulada
Com marcas de dedos no pescoço
e vestígios de dedadas

Tudo se não fosse
pela minha brisa errada
**

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Arroz, feijão e isso (fetriche fanopéia)

“Arroz , feijão e isso (fetiche fanopéia)”


Meu amor sabe fingir

Que me mataram e eu morri

E aí, e aí

E aí ele me beija morta

E me fornica morta

E copula comigo morta


E ele me morde morta ainda morna

E ele me fornicarniça

E copula comigo morta


Ele monta no meu corpo morto

Monta vivo no meu corpo morto


Ele me morde morta

E me lambe morta

E copula comigo morta


E então ele veste o calção

E me larga cadáver no chão

E vou me recompondo estática,

Enquanto me decomponho.